Compartilhe

Sua equipe não te entende? O problema pode ser você 

Avalie o artigo
Descubra como a comunicação na liderança impacta a produtividade, o engajamento e os resultados da equipe – e aprimore essa competência essencial!

Comunicar — verbalmente ou não — é a essência da liderança. Parece óbvio, mas, na prática, muitos gestores subestimam esse fator tão crucial.

Vejo líderes em potencial negligenciando a comunicação como competência básica e fundamental, sem perceberem o impacto direto que isso tem na produtividade, no engajamento da equipe e nos resultados do negócio. 

Diversos estudos acadêmicos que explicam como a comunicação é capaz de influenciar diretamente o estado de espírito, as escolhas e o desempenho dos liderados. Mas vou, neste artigo, usar os exemplos que vivo no dia a dia que podem explicar essa realidade com facilidade.

Afinal, trabalhando com gestão de processos e estratégia há mais de 25 anos, posso afirmar que, na minha amostra de alunos e clientes, a comunicação é, para cerca de 90% das empresas, a maior queixa dos times de trabalho. 

As variações dessas reclamações são diversas: vão desde a falta de comunicação sobre a estratégia da empresa até as falhas de comunicação rotineira entre as áreas para promover a integração necessária aos processos.

A falta de feedbacks dentro de uma mesma equipe é outra reclamação surpreendentemente recorrente (surpreende pelo fato de se dificultar algo que deveria ser bastante simples e dominado por qualquer gestor). 

Acontece que todos esses problemas poderiam ser resolvidos com certa facilidade se o papel de comunicação dos líderes não fosse tão negligenciado.

Líderes devem desenvolver a comunicação intencional, orientada a resultados, e aqui vai a minha leitura sobre ela em 10 pontos que uso para avaliar a maturidade comunicativa de cada líder: 

1 – Compreensão do processo de comunicação

Muitas vezes, a comunicação é tratada como um caminho simples, unidirecional, certo ou automático (ou seja, quase mágico!). Pessoas que presumem que, pelo fato de terem dito algo, sua mensagem foi compreendida estão longe da maturidade.

Quando encontro líderes com uma certa mania de perguntar ao final de uma explicação “entende?”, minhas ‘antenas’ já me mostram o risco dessa falha. É que a realidade da via de mão dupla da comunicação é muito mais complexa. Perguntar a alguém simplesmente “entende?” não faz qualquer sentido, pois é muito fácil que se entenda qualquer coisa diferente daquilo que era buscado.

Pessoas com mais maturidade comunicativa são aquelas que partem da premissa de que a obrigação de se fazer entendido é do emissor da mensagem (afinal, ele é o único que a possui até então).

Isso implica que se compreenda que a mensagem será decodificada por outras mentes com visões de mundo distintas e que podem percebê-la de forma completamente diferente da desejada.

O processo é tão impreciso que uso uma passagem de Elena Ferrante para ilustrá-lo: segundo a brilhante autora, ela perde muito entre a ideia que passa por sua mente e a que ela consegue colocar no papel.

Ora, se alguém que consegue encantar tanto usando apenas a linguagem assume essa dificuldade, imagine as falhas que nós, reles mortais não cometemos ao tentar nos explicar?!

Dica básica: na próxima vez que se sentir tentado a perguntar “entende?”, corrija-se para: “o que você entende/pensa sobre isso?”. 

2 – Falta de contexto e de argumentos claros

Na conhecida cultura de comando-controle, o domínio das tarefas a partir de uma visão mecanicista da firma (ou seja, a firma é uma máquina e as pessoas são engrenagens) não exigia mais do que comandos simples do tipo “faça isso”.

Mas o nível de concorrência e dinamismo atuais não permite que as pessoas atuem como simples engrenagens que repetem sempre um mesmo trabalho. Nesse sentido, entender e responder a mudanças requer uma visão do contexto no qual os processos acontecem.

Além disso, quanto mais capacitados os colaboradores, menor a chance de aceitarem comandos cegos, para os quais eles não entendam o propósito ou a estratégia envolvida. Contextualizar é uma das condições para sairmos do comando-controle e criarmos uma cultura de competência-confiança

3 - Falhas na escolha das palavras e do tom de voz

Sim, as palavras importam. E muito. As palavras contidas na mensagem ajudam — ou atrapalham — a dar contexto sobre o que está sendo dito.

Cada uma delas carrega um significado que vai além de um mero conjunto de letras. Eu costumo dizer que toda palavra carrega uma heurística, mas aí, esse artigo já vai ficando filosófico demais.

Voltando à prática, um exemplo bem simples sobre isso é o uso de palavrões — uma simples palavra muda a forma como o mensageiro é percebido e muda a percepção sobre a mensagem. E a escolha das palavras também influencia o tom de voz adotado e vice-versa.

Palavras de baixo calão mexem com o subjetivo do ouvinte, mas há outras formas de fazer isso. Hoje mesmo, estava conversando com um novo mentorado que está saindo de um cargo técnico e migrando para um cargo de liderança e ele soltou a seguinte frase “… precisamos colocar lei nesse pessoal…”.

Já um colega conselheiro, tem por hábito tentar impressionar com um “não tem conversa!”. Acho que é possível perceber o quanto essas palavras têm peso, certo? Elas refletem a visão que o aspirante a líder tem sobre as pessoas e como ele entende que a liderança deva ser exercida.

Sem alguns ajustes, ele se tornará o clássico ‘chefe’, ou seja, um pseudo-líder que se impõe pelo cargo, ao invés de um líder real que consegue substituir a imposição pela inspiração.

No fundo, ele poderia produzir as mesmíssimas consequências utilizando outras palavras e ainda ser valorizado como um líder maduro e orientado a resultados.

Há também o caso de uma outra empresa na qual se usa o termo “marcar um X nas coisas” quando se refere a um colaborador que o CEO pensa em demitir. Será que as pessoas pensam nesse chefe como um assassino capaz de atirar pelas costas?! 

4  - Dificuldade de alinhar o que se diz com o que se faz

Se palavras importam, o exemplo importa ainda mais. Vale aqui a velha ironia do “faça o que eu digo e não o que eu faço”. Qualquer comportamento comunica e o ato não verbal é, geralmente, mais forte.

Eu nunca me esqueço do caso de um líder que me recebeu em sua empresa há muitos anos atrás: um senhor idoso e falante que, assim que me levou à recepção, não pensou duas vezes para se abaixar e consertar o grande tapete que estava mal colocado na entrada.

Confesso que até eu fiquei meio sem graça pensando se não seria eu, bem mais jovem, quem deveria ter se abaixado para corrigir o problema. Imagine a cara das pessoas que trabalhavam naquela recepção.

Enfim, transmitir uma mensagem que não coincide com o próprio comportamento gera má compreensão ou até repulsa e descredibilidade. E a credibilidade não é algo que um líder possa prescindir e é, justamente, resultado do ato de comunicar. 

5 - Não canalizar a mensagem ao receptor correto

Comunicar-se de forma genérica sem direcionar-se exatamente a quem precisa ouvir a mensagem destrói a importância da transmissão.

Na falta de tempo do dia a dia, é comum que líderes se direcionem ao time de forma geral e pontuando problemas que acontecem sem nomear responsáveis.

Ainda que isso tenha como objetivo não expor pessoas da equipe, não gera o compromisso em quem recebe a mensagem. Afinal, é fácil para o ouvinte pensar algo do tipo “esse recado não é para mim; deve ser para o colega aqui ao meu lado” e sequer se esforçar para compreender de forma mais precisa.

Eu me deparei com essa prática algumas vezes, por exemplo, em empresas com objetivos de redução de gastos, quando gestores reuniam suas equipes para falar do projeto e dizer frases de conscientização do tipo “temos que economizar”.

Entretanto, sem identificar claramente os comportamentos que causavam gastos desnecessários e as equipes envolvidas, sempre que eu interagia com as pessoas, percebia que elas simplesmente não tinham entendido o que poderiam fazer.

Resumo da história: conversas focadas com os receptores mais relevantes e com argumentos que demonstrem onde e como eles devam atuar são fundamentais para a performance. 

6 - Empatia é uma competência e não apenas uma palavra bonita

Aqui, precisamos abordar a inteligência emocional que possibilita tanto a compreensão do ouvinte quanto o respeito ao outro. Usar arrogância para esconder a sua insegurança (ou até a pura falta de educação) é, infelizmente, mais comum do que esperaríamos, inclusive no C-Level.

Uma gerente de um cliente, por exemplo, tem a prática de transmitir a sua equipe frases do tipo “quem não concordar com isso, não precisa ficar” (ou variações menos agradáveis da mesma).

Ao querer demonstrar seu poder dizendo algo que, inclusive, é óbvio, ela se diminui perante o time que não se furta a criticá-la nos encontros fora da empresa.

Outro exemplo é o do diretor qu[e insiste em justificar suas decisões com frases do tipo “porque eu quero” ao invés de usar bem os argumentos reais que ele possui (sim, já conversei sobre isso com ele e o que não lhe faltam são argumentos).

Respeitar seu ouvinte é condição básica para que se transmita a mensagem da forma adequada. E, adivinhe, de quem é a responsabilidade de ‘ler’ o seu público e tratar com flexibilidade a forma e o tipo de mensagem a ser levada? Sim, do líder. Entender isso ajuda a ser ser menos arrogante e mais serviente.

Em primeiro lugar, se alguém se dispõe a te ouvir, já merece o seu respeito. Em segundo, quem tem a comunicação como instrumento de trabalho deve entender que ela é a melhor forma de demonstrar sua competência.

Algumas dicas simples podem ajudar:

  • Entender o contexto da conversa e, principalmente, o porquê ela está acontecendo;
  • Saber ouvir para entender o seu próprio ouvinte, ou seja, respeitar e codificar toda pergunta colocada;
  • Evitar o uso de jargões, termos em inglês e siglas que ele pode não entender;
  • Estar atento a pistas não verbais (linguagem corporal, por exemplo),
  • Colocar-se no lugar do outro e imaginar variações de compreensões a partir da realidade do ouvinte (ok, essa dica já não é tão simples assim);
  • Nunca usar frases sem qualquer sentido prático, em especial, aquelas cujo único resultado é causar medo (tais como “só ficarão na empresa aqueles que se adequarem”) e focar em ações concretas a partir das competências e capacidade de compreensão do próprio time. 

7 - Simplifique sempre

Quanto mais clara e direta a mensagem, maior a chance de que ela seja compreendida da forma como se espera. Ser objetivo, usar evidências —  diferenciando-as claramente de suas opiniões próprias— e não gastar muita saliva com explicações desnecessárias, não só facilita a compreensão, mas também atrai o ouvinte.

Até a minha prática de planejamento estratégico mudou muito quando eu compreendi isso. Hoje, ao perceber que há muito dinheiro na mesa com estratégias simples, foco nessas para que, apenas após alguns meses de ação e ganhos, eu possa discutir estratégias mais avançadas com todos.

Na verdade, o princípio da economia (ou da simplificação) é bastante antigo e há até uma base filosófica do século XIII a partir do frade Guilherme de Ockham. De forma resumida, ele concluiu que não é inteligente fazer com mais, aquilo que pode ser feito com menos (o mesmo princípio da elegância das provas matemáticas).

Alguns dos meus mentorados, ao serem percebidos como prolixos, me ouvem brincar: “passa a navalha (de Okcham)!”.

Pode parecer duro, mas pessoas prolixas, simplesmente, não conseguem liderar: ou elas não inspiram, ou não conseguem entender o que é mais importante. E essas são duas competências importantes demais para serem negligenciadas. 

8 - Desenhe

Com caráter pejorativo, há pessoas que ainda perguntam “quer que eu desenhe?” quando alguém não entende sua mensagem. Além de arrogante, essa frase é pouco profissional.

Afinal, como líder e comunicador, usar recursos visuais ou de quaisquer outros tipos para facilitar a compreensão do seu ouvinte não é nada além da sua obrigação. Simples assim.

Aguçar todos os sentidos possíveis do receptor é uma competência diferenciadora e se ‘uma imagem vale mais do que mil palavras’ é porque ela carrega em si elementos que vão além do que a palavra pode expressar, inclusive no nível subjetivo. 

9 - Destaque os pontos cruciais daquilo que deseja transmitir e use uma melhor ordenação

Da mesma forma que as crianças aprendem a fazer redações com o velho guia ‘introdução-desenvolvimento-conclusão’, há melhores práticas propostas para o ato de comunicar.

A comunicação piramidal, por exemplo, nos ensina a começar pelo fim, ou seja, a introduzir o objetivo, depois entrar nos argumentos para o resultado buscado e, depois disso, apresentar detalhes baseados em dados.

Esse exercício não é trivial nem para o emissor da mensagem e, fazê-lo, auxilia muito no refinamento dela. Outra boa dica é explicitar os pontos de destaque ao longo da fala com expressões do tipo: “se você tiver que lembrar de apenas uma coisa, que seja essa…” ou “os três pontos principais que estamos abordando aqui são…” (ok, esse tópico é um dos mais difíceis na minha aula de gestão na complexidade, mas é até divertido. Vale um artigo a parte depois). 

10 - Tenha foco no fim, mas preocupe-se com o meio

A forma como uma mensagem é transmitida impacta diretamente na sua compreensão. Quem nunca ouviu “mas eu mandei um e-mail…”, ou então, “…acredita que ele foi demitido por whatsapp”?

Pois bem, os canais de comunicação são diversos — síncronos, assíncronos, digitais, analógicos, etc — e a escolha deles diz muito sobre o comunicador e o quanto ele respeita, se interessa pelo feedback e se preocupa com o ouvinte. 

Naturalmente, é possível ir além dos 10 pontos acima explicitados, mas usando o princípio da economia de Ockham, podemos parar por aqui.

Nos tópicos tratados, já se percebe que as ideias começam a se sobrepor e alguns elementos podem ficar redundantes. Além disso, eu não quero perder aqui o foco naquilo que é mais importante, certo?!

A figura que ilustra esse artigo também ajuda a entender todos os pontos abordados de forma esquemática e é uma adaptação a partir da teoria da comunicação.  

Na figura acima, fica claro que o propósito da comunicação é orientador. Ele tem a ver com tudo o que discutimos até aqui, uma vez que a compreensão do receptor, o meio, o tom de voz, entre outros, devem ser alinhados a esse objetivo. Como exemplo real, cito o caso de um novo gerente de uma empresa cliente.

Fizemos uma reunião, na qual eu me dedicaria mais a ajudá-lo. Entretanto, talvez por não me conhecer bem ou pela presença do CEO, ele ficou tão nervoso com a conversa que não conseguiu entender o papel de todos ali.

Foi evasivo e até grosseiro, usou respostas genéricas e não conseguiu demonstrar com clareza os objetivos e as dificuldades na implantação de um projeto audacioso.

A sensação causada foi de que ele não sabia o que estava fazendo, afinal, não sabia falar a respeito e explicar os detalhes mais importantes. Qualquer pessoa que implanta uma mudança desafiadora tem dificuldades e é preciso falar sobre elas quando questionada.  

A comunicação de um líder deve fluir bem em qualquer direção: com seu time e com seus líderes e uma das falhas mais perceptíveis por todos na comunicação de baixo para cima (ou seja, com os superiores) é a atitude reativa.

Qualquer comunicador está, intrinsicamente, cumprindo um papel de avaliado, mas isso não pode ser motivo de insegurança. Todos os pontos previstos acima são válidos nesse caso, mas é preciso ter atenção especial para se ‘ler’ o ouvinte e estabelecer conexão com ele ao invés de fugir da discussão de forma reativa. 

E para concluir, seguindo o penúltimo ponto da relação acima, se você quiser escolher apenas 1 coisa para se lembrar desse artigo, sugiro a seguinte: a responsabilidade pelo sucesso da comunicação é do líder que transmite a mensagem.

Recentemente, estive com especialistas em comunicação que me diziam que todo líder tem o direito de ser compreendido. Expliquei a elas a minha perspectiva: para mim, o líder tem o DEVER de ser compreendido.

Entender isso ajuda a assumir a sua própria responsabilidade sobre o processo e entender que essa é uma competência decisiva, intencional, que deve ser desenvolvida quando se quer chegar a um lugar de liderança.  

Então, que tal refletir sobre os pontos discutidos e avaliar como você pode aprimorar sua comunicação para inspirar e guiar seu time com mais clareza e impacto? Compartilhe nos comentários: qual desses desafios comunicativos você mais percebe no dia a dia e como tem lidado com ele? Vamos continuar essa conversa!

Foto de Renata Barcelos

Renata Barcelos

Renata Barcelos é engenheira civil, doutora e mestre em Administração de Empresas pela UFMG. Professora da FDC - Fundação Dom Cabral, é conselheira, investidora e mentora de startups. Atua em projetos nas áreas de Inovação, Ambidestria Estratégica e Transformação Digital. Mentora de executivos e sucessores familiares, promove a mudança cultural como alavanca fundamental para o futuro das empresas tradicionais e da sociedade.

newsletter

Cadastre-se e receba

nosso conteúdo exclusivo

Você está fornecendo o seu consentimento para a LG lugar de gente para que possamos enviar comunicações de marketing. Você pode revogar o seu consentimento a qualquer momento. Para mais informações, consulte nossa Política de Privacidade.