No meu primeiro artigo para o blog da LG, retomo um tema que gerou meu artigo de maior sucesso, ainda em 2020. Naquela época, no meio da crise da Covid-19, eu estudava e refletia sobre o desenvolvimento de uma cultura organizacional que potencializasse a forma como empresas e pessoas encaravam os grandes desafios que enfrentávamos.
O pior da crise passou e ficou muito claro como a velocidade, a criatividade, a colaboração e a coragem com as quais tivemos que aprender são condições fundamentais para encararmos quaisquer tipos de problemas complexos e, naturalmente, inovações.
Apelidei essa lógica de cultura de competência-confiança e sigo, desde então, levando essa ideia a diversas empresas, em especial, aos líderes das áreas de RH que são os maiores guardiões da cultura nas empresas.
O jeito mais fácil de se entender essa proposta é colocando a competência-confiança em comparação com a antiga e conhecida lógica de comando-controle que moldou o desenvolvimento das organizações e o desenvolvimento da própria Teoria Geral da Administração (quem fez esse curso deve se lembrar bem de Taylor, Ford, Fayol, entre outros).
No mercado pouco competitivo e ainda em desenvolvimento no início do século XX, o crescente setor industrial focado na produção em série podia encarar as pessoas como meras engrenagens de um sistema mecanizado, previsível e controlado que contava com a repetibilidade para atingir eficiência.
A divisão do trabalho humano em tarefas eliminava a necessidade reflexiva e criativa e uma legião de ‘comandados’ se desenvolveu com as empresas e, em alguns setores, existe até hoje.
Entretanto, a aceleração da inovação, da competitividade, do dinamismo dos mercados e, por conseguinte, o aumento da incerteza e complexidade exigem, na atualidade, um novo perfil de profissional e, inclusive, um novo perfil de estratégia que passa a ser cada vez mais ágil. Nela, pessoas meramente ‘comandadas’ – que estão sempre aguardando as orientações de um superior – não geram o nível de responsividade necessária ao ambiente competitivo que requer melhoria e inovação contínuas.
É neste contexto que a cultura de competência-confiança se faz necessária: em empresas e mercados dinâmicos que requerem que as pessoas em todos os níveis tenham percepção avançada e autoridade para responderem rapidamente a novas demandas que impactam diretamente na geração de valor.
Em uma espiral crescente, a competência das pessoas alavanca a autoridade dos times e, por conseguinte, fomenta a auto responsabilização e os resultados. Em ciclos contínuos, essa cultura aumenta a curiosidade, o interesse e a criatividade para identificar e solucionar problemas. Isso acelera a entrega de novos produtos e serviços ao mercado, bem como a redefinição de processos trazendo um dinamismo condizente com o exigido pelo ambiente externo.
Enquanto isso, a confiança promove comprometimento, motivação e fluxo rápido de informações. Mas não é qualquer tipo de confiança. Estamos falando aqui da confiança na entrega de resultados que se baseia, justamente, nas competências das pessoas.
Lembro-me de uma empresa que se encantou tanto com a ideia da competência-confiança que se ‘esqueceu’ dos resultados para que essa cultura funcionasse e potencializasse o sucesso. Focou na confiança, mas não promoveu a competência para o desempenho esperado.
Desde então, sempre saliento: líderes devem desenvolver e confiar em pessoas e times com foco em resultados, que olham para o sucesso da aplicação de suas competências e não apenas valorizem o esforço empreendido.
Dessa forma, a liderança torna-se ainda mais fundamental, mas não de forma centralizadora e na operação do dia a dia mas, sim, no seu papel mais importante: alocar os talentos certos para os desafios, delegar e ajudá-los a crescer. Na prática, a liderança se torna orquestradora de recursos atuando tanto na priorização, quanto no alinhamento estratégico e ajuste contínuo de rotas.
Ao invés de microgestão e lógica de poder, os líderes podem assumir visão crítica e sistêmica ampla e identificar novas oportunidades. Além disso, passam a atuar como ‘servidores’ de times que se autodesenvolvem e não como pseudo-heróis que precisam estar presentes em todas as decisões.
O resumo da proposta de uma cultura baseada na competência-confiança encontra-se na tabela abaixo:
Naturalmente, a construção de uma nova cultura e a adaptação total à ideia da competência-confiança dependerão do timing e da estratégia de cada empresa. Quanto maior a relevância da inovação, da solução de problemas complexos e da agilidade na estratégia planejada, maior a necessidade dessa ‘virada’ que, às vezes, exige, inclusive, a troca de alguns líderes que se negam a atuar de forma integradora e servidora.
É que muitos deles continuam viciados no modelo administrativo que aprenderam desde o início do século passado e ainda não perceberam que, em especial, as novas gerações e a era digital trazem necessidades e oportunidades totalmente distintas para o futuro.
Isso sem falar nas demandas altamente complexas que questões ambientais e sociais ainda trarão às nossas empresas exigindo, cada vez mais, adaptabilidade, responsabilidade e inovação.
Abraçar a ideia da competência-confiança é entender que o dinamismo talvez seja a maior fonte de vantagem competitiva para os negócios. É entender e praticar, de fato, condições para que todo o potencial humano seja desenvolvido e aproveitado dentro das organizações.
É criar condições para a construção do futuro, ao invés de simplesmente, se manter em uma posição de esperar que ele aconteça com a gente.
Enfim, estamos vivendo uma nova era da Administração de Empresas. Você já percebeu isso? Consegue identificar seus vícios reflexivos e comportamentais do passado enquanto exerce seu papel de líder? Assumir isso é o primeiro passo. Boa jornada para a mudança!