Não é segredo que a desigualdade de gênero ainda existe e cria vários obstáculos para a inclusão feminina nas empresas. Segundo um estudo do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), o percentual de mulheres no mercado de trabalho brasileiro foi de 45,8% no terceiro trimestre de 2020. O nível mais baixo desde 1990, quando a taxa ficou em 44,2%.
Mesmo com os benefícios de ambientes mais diversos cada vez mais evidentes, houve uma queda expressiva na participação de mulheres no mercado. Por isso, esse resultado deve servir de alerta aos dirigentes de empresas, à sociedade e à área de gestão de pessoas: como promover, de fato, uma mudança e apoiar o acesso de mulheres ao mercado?
Para colaborar com essa reflexão, contamos com a participação da Leyla Nascimento, Vice-Presidente de Relações Internacionais da ABRH Brasil, e Rachel Matos Dornelas, Gestora Estadual do Projeto de Empreendedorismo Feminino Sebrae DELAS.
Trajetória das especialistas
Leyla é formada em pedagogia pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), pós-graduada em Educação e Recursos Humanos pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), e mestre em Gestão Empresarial pela Fundação Getúlio Vargas.
A profissional é fundadora e CEO do Grupo Capacitare e voluntária na ABRH Brasil. De 2018 a 2020, ocupou a presidência da World Federation of People Management Associations, a mais alta Federação Mundial de Recursos Humanos, que reúne 93 países.
“Tenho uma trajetória profissional de mais de 40 anos. Ocupei cargos executivos e desbravei os caminhos de ser a primeira mulher em muitos deles. A minha geração foi a primeira que teve mulheres ocupando cargos executivos”, compartilha Leyla.
Rachel é publicitária de formação, mas sua carreira se desenvolveu na área da Educação. Após a graduação, trabalhou um tempo na Secretaria de Educação, dentro do Centro de Referência do Professor. Além disso, atuou na Fundação Dom Cabral com educação corporativa nos cursos de MBA.
Então, a profissional foi para o Sebrae e começou a trabalhar no projeto de Sucessão em Empresas Familiares, além de ter sido gestora por quase 10 anos no Programa Nacional de Educação Empreendedora.
“Agora, tenho a oportunidade de me desenvolver trabalhando e estudando empreendedorismo feminino com o projeto Sebrae DELAS e inovação no Projeto Fator S, que é a jornada de startups do Sebrae. Tudo permeado, claro, pela educação empreendedora”, reforça.
A gestão de pessoas frente ao incentivo a inclusão feminina no mercado de trabalho
Segundo Leyla, os desafios continuam, especialmente em um país como o Brasil, em que algumas regiões possuem uma cultura de líder centralizador, com resistências ao trabalho e competência do gênero feminino.
“Temos várias iniciativas em nosso país em que as áreas de Recursos Humanos procuram dar orientação aos líderes terem o foco na competência, além da necessidade de as empresas superarem os desafios de um mundo tão complexo”, afirma.
O cenário de discriminação das mulheres no acesso ao mercado de trabalho em igualdade de condições é mundialmente reconhecido e muito obstáculos ainda precisam ser vencidos. Para Leyla, é preciso reconhecer as pesquisas que apontam uma desaceleração da conquista ascendente de mulheres no ambiente profissional devido a pandemia da covid-19.
“Dentre elas, temos a pesquisa da Price Whaterhouse Coopers (PwC), intitulada ‘Women in Work Index 2021’. Os dados já sinalizam que até 2030 os danos causados poderão levar a uma diminuição da inserção de mulheres no mercado de trabalho, se comparado ao período anterior a pandemia”, ressalta.
As políticas e estratégias da gestão de pessoas têm tido o objetivo de cuidar da diversidade nas companhias em um mundo que solicita equidade no tratamento entre seres humanos. A Vice-Presidente de Relações Internacionais salienta que as empresas desejam profissionais competentes frente a tantos desafios e o gênero não é garantia de competência.
Anteriormente, as organizações consideravam que os homens trariam resultados, cumpririam metas com mais sagacidade e a lógica seria fundamental. “O mundo evoluiu e estamos com uma sociedade que deseja qualidade de vida e trabalho. A felicidade no trabalho não é filosofia, é possível”, declara.
O tabu da fragilidade feminina
Leyla destaca que em uma fase de sua vida, para conseguir demonstrar competência, precisava ser e se parecer com o sexo masculino. Para isso, fazia uso de ternos e blazers para obter respeito dos meus pares. Além de escutar que deveria ter cuidado com o que falava nas reuniões de diretoria, pois achavam que não seria capaz de estar naquela função.
“Há um fato interessante, quando a minha secretária na época disse que um juiz do trabalho gostaria de uma reunião comigo. No dia e hora marcados, fui ao elevador recebê-lo por educação e acolhimento. Ele me disse: ‘Onde está o seu diretor?’. Respondi: ‘Sou eu’. Jamais esquecerei o rosto dele de surpresa. Tenho experiência de situações vividas por preconceito, por ter sido uma líder mulher, que só me fortaleceu a seguir em frente”, evidencia.
O resultado das diferenças
A diversidade no quadro de colaboradores pode provocar vantagens competitivas entre as organizações, além de fortalecer a inovação e o enriquecimento do ambiente de trabalho pela pluralidade de pessoas.
De acordo com Rachel, algumas pesquisas realizadas pela Mckinsey, pela ONU Mulheres e pelo Banco Mundial, apontam que, quanto maior for a diversidade na alta cúpula da empresa, maior será o lucro arrecadado pela instituição.
“A mulher tem um estilo de liderança que estimula o desenvolvimento de comportamentos e características como a empatia, a cooperação e a abertura de ideias. Além do fato de que ter pessoas diversas, com formas de pensar diferente daquelas que sempre ocuparam as presidências e diretorias das empresas, possibilita ideias, novas respostas e vários pontos de vista e o mundo está precisando dessa revisão urgentemente”, explica Rachel.
Os desafios da vida profissional e pessoal
Dentre os desafios para a inclusão feminina no mercado de trabalho e, principalmente, em cargos de liderança está a conciliação da vida profissional e pessoal das mulheres.
Rachel acredita que se as tarefas de cuidados com o lar, com os filhos e outras obrigações forem igualmente divididos entre o casal ou com outros familiares, as mulheres conseguem ter as mesmas condições que seus colegas de trabalho.
“Negócios liderados por mulheres têm exatamente a mesma capacidade de crescer de forma sustentável que os liderados por homens, no entanto, a sociedade precisa entender que esse ‘trabalho invisível e não remunerado’ é responsabilidade de todos”, afirma ela.
Segundo a Gestora Estadual do Projeto Sebrae DELAS, muitas mulheres ainda sofrem com a sobrecarga da saúde física e mental em função de suas múltiplas jornadas de trabalho, além do sentimento de culpa por não darem às suas famílias a atenção que elas acham que deveriam.
Para Rachel, é preciso sensibilizar a sociedade quanto à importância da equidade de gêneros, fortalecendo redes de apoio e fomento ao empreendedorismo feminino.
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