Um dos desafios que constantemente está sendo enfrentado pela gestão de pessoas é o de aumentar a produtividade das equipes e, assim, conquistar melhores resultados para as organizações. Sabendo da relevância do tema, durante 16 anos, Marco Tulio Zanini e Carmem Migueles, Consultores da Symbállein e Professores Pesquisadores da Escola Brasileira de Administração Pública e de Empresas (FGV/EBAPE), conduziram um estudo longitudinal que busca relacionar cultura e produtividade e chegaram a importantes conclusões.
Segundo os autores, nesse tempo, foi observado o amadurecimento de apenas um pequeno grupo de gestores a respeito de fatores intangíveis que produzem o verdadeiro valor nas empresas. “Somos um país produtor de commodities, as questões de qualidade, sustentabilidade e inovação sempre dominaram os discursos e os congressos, mas não foram geridos como estratégia no ambiente corporativo brasileiro”, afirmam Marco Tulio e Carmem.
Mesmo com a chegada das novas gerações ao mercado de trabalho, para os pesquisadores, sem uma orquestração conduzida pela alta liderança, com suporte do conselho de administração, há pouco que os millennials possam fazer no cenário empresarial. “O contexto é árido para a inovação. Ainda é muito mais um discurso do que uma prática efetiva”, avalia eles.
O estudo identificou fatores da cultura nacional que impactam a produtividade do trabalho no Brasil. “Ao tratar a cultura como um ativo intangível, é possível isolar os fatores que promovem a cooperação, o engajamento e a colaboração para o médio e longo prazo. Também identificar os passivos, que funcionam como ralos de tempo e de energia humana, que impedem ganhos de produtividade, competitividade e inovação”, afirma os professores.
Nos resultados da pesquisa, eles identificaram o impacto de três elementos da cultura brasileira que geram círculos viciosos de perdas de produtividade:
1- Baixa propensão a confiar
2- Alta distância entre o topo e a base das organizações
3- Forte propensão ao controle das incertezas
Confiança e produtividade
A confiança foi apontada como fator mais significativo para aumento da produtividade. Segundo Carmem e Marco Tulio, há um trabalho muito importante que precisa ser feito para que nossas lideranças nos levem a um cenário de maior competitividade: “As oportunidades são enormes e não é necessário muito investimento para isso. Inclusive, os investimentos realizados historicamente em educação e infraestrutura no Brasil não impactaram em ganhos reais de competitividade”.
Para os especialistas, a confiança é fundamental pois é a base para a cooperação entre muitos agentes que tenham foco em resultados desejáveis para todas as partes envolvidas no médio e longo prazo. O ato de confiar reduz custos de controle e monitoramento, e a percepção de risco em contribuir para o futuro. “Países com baixa confiança não conseguem inovar de forma competitiva. Gastam tempo e energia em controles no curto prazo, o que inibe a colaboração e a capacidade de resolver problemas complexos e sistêmicos”, avaliam.
Além disso, de acordo com os pesquisadores, a baixa confiança causa estagnação e abre brechas para comportamentos oportunistas. “O excessivo controle atrofia a autonomia e, com isso, aumenta a percepção de riscos para os indivíduos que querem inovar, o que cria custos de transação imensos para quem quer fazer a coisa certa”, comentam eles.
Liderança compartilhada
Para Carmem e Marco Tulio, o equilíbrio entre o exercício da liderança compartilhada e a busca contínua pela disciplina operacional, apoiando quem tem mérito a entregar e desenvolver resultados cada vez maiores é a chave para sair do contexto de baixa produtividade. “Temos que tirar o nosso foco (típico de uma sociedade de baixa confiança) quase que exclusivo em normatizações, controles excessivos e busca por resultado financeiro de curto prazo, para a estruturação de esforços de apoio aos indivíduos que podem colaborar com o aprimoramento dos processos e desenvolvimento organizacional a serviço de resultados mais inteligentes”, explicam os consultores.
Nesse sentido, a liderança compartilhada pressupõe o comprometimento de todos os envolvidos na busca por alternativas dentro das restrições existentes, já a disciplina operacional diz respeito à análise do contexto, hierarquização de prioridades e análise das causas internas que dificultam o avanço na direção desejada e o conhecimento claro das limitações. “Observamos ao longo destes anos que esforços nessa direção têm um impacto mensurável na redução da taxa de acidentes de trabalho e em outras perdas. Aumentam a integração interna e a capacidade da organização de se adaptar ao contexto externo com mais inteligência e efetividade”, reforçam Marco Tulio e Carmem.
Os principais erros? Segundo os professores, foco no curto prazo, planejamento reativo, foco demasiado em indicadores financeiros, baixa disciplina operacional e a impossibilidade de se fazer uma gestão meritocrática nesse contexto. “Ao contrário do que o senso comum aponta, temos educação necessária para promover uma mudança. O nosso maior problema, no entanto, está na forma como os fatores apontados acima afetam negativamente a cooperação e a colaboração internamente nas organizações brasileiras. As nossas altíssimas taxas de acidentes de trabalho e a nossa baixa capacidade de inovar têm as mesmas causas culturais”, avaliam.
Sobre a pesquisa
A origem do estudo vem da relação entre cultura, competitividade e produtividade nas economias, que já está sendo analisada há alguns anos internacionalmente. “Desde a década de 1980, com o sucesso japonês, muitos pesquisadores buscam compreender essa relação. Porém, as conclusões eram limitadas, pois se verificava que os fatores não eram exportáveis e haviam sido desenvolvidos ao longo da história dos países”, explicam.
A pesquisa nas organizações brasileiras envolveu 12 empresas de grande porte, 12 empresas de médio porte e duas organizações específicas que foram objeto de estudos em profundidade. “Em conjunto, foi gerada a maior base de dados do mundo sobre relações de confiança em empresas, com uma amostra com 1620 questionários válidos e uma sequência de coleta de dados em organizações especificas de maior confiança entre 2011 e 2017, contemplando organizações públicas, privadas e de governança híbrida (empresa privada que presta serviço para o governo)”, comentam Marco Tulio Zanini e Carmem Migueles.
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