A adoção do home office definitivo está nos planos da sua empresa? Com a pandemia de covid-19, muitas empresas adotaram o modelo e verificaram que é possível manter suas atividades, produtividade e engajamento dos colaboradores. No entanto, a que é preciso estar atento antes de aderir ao modelo de trabalho remoto definitivamente?
Para Luciana Gouvêa, Sócia da Área Trabalhista do Melo Campos Advogados, as empresas precisam acompanhar de perto as mudanças na legislação trabalhista acerca do tema. A Medida Provisória nº 927, por exemplo, que havia sido editada em março deste ano e previa a flexibilização do contrato de trabalho para a adequação ao trabalho remoto, caducou em julho.
E como fica para aqueles que adotaram o modelo?
Apesar da proposta da MP 927 ter caducado na Plenária, adotar o home office ainda é um mecanismo viável para a proteção dos empregados e uma medida de saúde e segurança coletiva. De acordo com Luciana, sua aplicação segue a critério da empresa e da anuência do empregado.
Detalhes legais do home office definitivo
Sem o suporte da MP 927, Luciana explica que as empresas que optarem pelo home office como modelo definitivo devem estar atentas às disposições previstas na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). Isso exige a realização de um aditivo contratual prevendo as condições do trabalho remoto, por isso, a especialista recomenda atenção a alguns detalhes específicos. Confira quais são eles:
Hora extra
A advogada ressalta o contato entre colaborador e empresa como um dos detalhes legais relevantes desse modelo. Segundo ela, a Medida Provisória previa que o tempo de uso de aplicativos e programas de comunicação fora da jornada de trabalho normal não constitui tempo à disposição, regime de prontidão ou de sobreaviso, exceto se houvesse previsão em acordo individual ou coletivo.
Sendo assim, dentro do modelo de home office definitivo, esse é um ponto que precisa estar bastante claro. “É aconselhável que as empresas reforcem as recomendações para que os empregados evitem o envio de e-mails e mensagens por meio de aplicativos fora da jornada de trabalho. Essa medida poderá mitigar os riscos de horas extras nesse sentido”, pontua.
Estrutura física
Outra disposição legal importante diz respeito à responsabilidade das companhias no que tange à estrutura física e ergonômica do funcionário em teletrabalho. Isso se estende inclusive para fins de caracterização de acidentes e doenças do trabalho.
“A responsabilidade das empresas pelo ambiente de trabalho do empregado que presta serviços remotamente é a mesma que lhes recai em relação àqueles que prestam serviços em suas dependências físicas”, explica Luciana.
Dessa forma, a advogada destaca a importância de a empresa estar atenta a esses cuidados tanto por meio do fornecimento de equipamentos como com o controle de riscos e a prevenção de acidentes por meio de programas internos.
“Implementando-se o home office definitivo, é aconselhável que a empresa se preocupe com a ergonomia dos empregados, fornecendo a estrutura necessária ao trabalho como mesa e cadeira, além de outras orientações que visem reduzir a possibilidade de doenças e acidentes de trabalho”, esclarece.
Além do viés jurídico
As possibilidades criadas por essa abertura ao trabalho fora das dependências da empresa vão além do conceito simplista do home office. É o que explica Cezar Taurion, Presidente de Estratégia e Inovação da Cia Técnica, ao apresentar o conceito de “work anywhere”.
“O trabalho passa a ser feito onde a pessoa está e não mais em um local específico para onde ela terá que se deslocar. O trabalho, portanto, não será 100% home office e nem 100% nos escritórios. Será um modelo híbrido em que alguns funcionários estão no escritório, enquanto outros trabalham em casa ou em outro lugar”, afirma.
Na avaliação de Cezar, o potencial de ganho para empresas e colaboradores nesse formato é ainda maior do que imaginado se for aplicado corretamente. Para ele, o novo modelo, se usado de forma adequada, promete:
- Maior acesso a talentos: eles poderão residir em outras cidades;
- Maior produtividade: não tem tempo e nem desgaste de ida e vinda do escritório;
- Mais flexibilidade individual e melhores experiências para os funcionários: balancear vida pessoal e profissional.
Novos formatos, novos desafios
Mesmo assim, é necessário entender que as possibilidades criadas pelo home office definitivo também são acompanhadas de novos desafios. Para Cezar, esses obstáculos estão além da adesão de novas tecnologias.
Nesse ponto, o especialista ressalta que as organizações terão que evoluir para definir meios de manter a motivação, o engajamento e a cultura organizacional em um ambiente híbrido.
“Novos padrões de comportamento em como atuar e conduzir reuniões e sessões virtuais terão que ser implementados. Os horários terão que ser flexíveis e isso vai implicar em mudanças na legislação. Os escritórios serão redesenhados e as práticas de relacionamento da empresa com seus colaboradores serão revistas. Os métodos de avaliação e gerenciamento terão que ser redesenhados. Os gestores terão que ser reeducados para gestão remota”, detalha.
A importância da segurança
Cezar Taurion prevê que, na medida em que cresce a necessidade de tornar o acesso remoto mais fácil, aumenta-se também o risco. “É urgente a adoção de tecnologias de cibersegurança, pois as vulnerabilidades e pontos fracos aumentam. Também é essencial tornar todo o ambiente de sistemas acessível ao trabalho remoto. Isso demanda uso mais intenso de infra como computação em nuvem e integração entre sistemas”, pontua.
Luciana acrescenta sobre a importância de aumentar a atenção das organizações aos riscos inerentes do uso de equipamentos pessoais para atividades relacionadas ao trabalho. “Caso as empresas entendam por conceder essa autorização, é recomendável que estabeleçam mecanismos mais efetivos de guarda e segurança da informação em relação ao empregado que utilizar dispositivos particulares para atividades de trabalho no home office, além de ajuste em relação a aluguel mensal pela utilização, o que pode estar contemplado na política a ser desenhada”, explica a especialista.
De todo modo, a advogada destaca que cláusulas de controle de pirataria e segurança da informação não afastam a responsabilidade da empresa em relação aos atos praticados por seus empregados.
“Ainda que se possa responsabilizar judicial e extrajudicialmente o empregado, via ação de regresso, não se elide a responsabilidade da empresa, que fatalmente será acionada caso detectado algum incidente de pirataria ou de vazamento de dados”, alerta.
RH ainda mais estratégico
Para Cezar Taurion, o momento exige que o RH tenha uma atuação mais estratégica do que vinha mantendo até aqui. Ele explica que cada modelo aplicado deve antes ser cuidadosamente validado.
“As decisões têm que ser estratégicas e analisadas à luz das demandas, cultura e modelos de operação da empresa. O que serve para uma não necessariamente servirá para outra, mesmo do mesmo setor. O RH também deve ser o líder no redesenho dos processos, práticas e orientação de como atuar em ‘work anywhere’”, argumenta.
Por isso, a adoção do modelo de home office definitivo demanda muito treinamento e educação para os funcionários da empresa. O especialista aponta que isso vai desde orientações de como se portar em reuniões virtuais até a atenção da gestão de pessoas para instituir regras que inibam o trabalho excessivo e o consequente burnout, a manutenção do engajamento e da produtividade cuidando para não violar a privacidade e assim por diante.
“O RH está diante de um desafio e tanto. Precisa se posicionar como líder nessa transformação e o primeiro passo é ele mesmo se adaptar a esse modelo. O RH precisa ser reinventado”, finaliza Cezar.
Sua empresa planeja adotar o home office definitivo? Nesse formato, os esforços com a segurança da informação devem ser redobrados. Veja aqui como se preparar para as adequações exigidas pela LGPD prevista para 2021.