Em 28 de junho, relembra-se o aniversário de 52 anos da Rebelião de Stonewall, ocorrida em 1969, em Nova Iorque. O acontecimento se tornou símbolo da luta pelos direitos e inclusão de pessoas LGBTQIA+ em todo mundo e, de lá para cá, muitos avanços ocorreram nesse sentido.
No entanto, outras transformações ainda são esperadas, inclusive dentro das organizações. É o que aponta a pesquisa “Melhores Empresas GPTW LGBTQI+ 2020”, que premiou as companhias com melhores programas de diversidade, mas que também apontou resultados alarmantes.
O estudo, promovido em 90 países, indicou que, no Brasil, 7,5% da população se declara LGBTQI+, mas esse público configura apenas 2,4% dos colaboradores nas empresas premiadas. Além disso, nessas organizações, o público recebe salários 4% menores do que o não LGBTQI+.
Nesse cenário, torna-se fundamental abordar os desafios que envolvem o asseguramento dos direitos e a promoção da inclusão de pessoas LGBTQIA + nas empresas. Por isso, para discutir o assunto, conversamos com Danilo Camapum, Gerente de Gente e Gestão na LG lugar de gente, e Letícia Rodrigues da Silva, Desenvolvedora na empresa, que passou recentemente por uma jornada de autoconhecimento inspiradora. Conheça a história da colaboradora e as percepções da LG diante do novo desafio.
Uma história inspiradora
Letícia é colaboradora da LG há 14 anos e, recentemente, procurou o departamento de Gente e Gestão da empresa para informar sobre a sua transição de gênero. Assim, ela foi convidada a contar a sua história aos demais funcionários no portal interno da organização.
A profissional explica que, antes de assumir a transição, passou pelo mesmo sentimento de receio e angústia que ocupa a mente de muitas pessoas em seu contexto. “Isso aconteceu principalmente em relação à manutenção do meu emprego. Infelizmente, sei que várias pessoas transgênero perdem seus trabalhos após contarem suas histórias, seja por desconhecimento do assunto pelo empregador, seja por puro preconceito”, lamenta.
No entanto, após a comunicação, ela recebeu apoio dos demais colaboradores, reforçando o caráter de acolhimento e inclusão de pessoas LGBTQIA + na organização. “Aqui tenho que deixar um agradecimento especial ao meu gerente Farley Rodrigues da Silva, pois sempre tratou a questão da diversidade com muito respeito e seriedade. Ele disse: ‘vou te ajudar a conduzir esse assunto aqui dentro’, o que me trouxe paz e confiança de que tudo ia correr bem”, relembra.
A preocupação com o seu bem-estar ainda veio a partir de muitas outras pessoas na LG. “A começar pela minha equipe de GCS, representada pela Patrícia de Almeida, e o RH, representado pelo Danilo Camapum, que sempre me perguntam: ‘como VOCÊ quer conduzir esse processo?’. Isso é muito especial”, comenta.
O acolhimento por parte dos colegas dentro e fora do departamento também tem sido um ponto alto neste momento. “É maravilhoso, tenho sido tratada com muito carinho e respeito. Acredita que as maiores preocupações deles são se poderemos seguir com as brincadeiras ou se continuaremos sendo amigos? Eu respondo: claro que sim! Sou muito grata pelos colegas e amigos que tenho aqui dentro, que hoje, mais do que nunca, percebo que gostam de mim pela profissional e ser humano que sou”, pontua.
O recado que Letícia dá para as empresas que querem promover mais inclusão e acolhimento à diversidade de gênero e sexual em seu ambiente de trabalho é objetivo e certeiro: “Façam como a LG lugar de gente, promovam diversidade na prática”.
É preciso incluir
Para Danilo, Gerente de Gente e Gestão na LG, a pauta de diversidade precisa ir além de não excluir pessoas: é necessário incluir. “Precisamos promover o acolhimento e o respeito à diversidade de forma empática e verdadeira. No próprio caso da Letícia, ela nos procurou e contou que estava passando por um processo no qual se entendia como uma mulher transgênero”, diz.
“A situação era nova para a gente, mas o principal é que, desde o gestor da área dela até o RH, todos se preocuparam em agir de maneira que fosse melhor para ela, já que não temos propriedade para ditar o que seria esse melhor. Somente ela poderia dizer”, continua.
O líder explica que a transgeneridade não foi tratada como um problema a resolver e sim como uma oportunidade de aprender. “Em nenhum momento ter pessoas trans na LG foi tratado como uma problemática, mas sim que medidas podemos tomar para que elas se sintam bem na nossa empresa diante de seus lugares. O acolhimento está em nosso DNA”.
Danilo ressalta que, na LG, um dos maiores índices alcançados em avaliações de clima corresponde justamente ao respeito à diversidade de idade, gênero, orientação sexual, raça etc. “Como homem gay representante do grupo LGBTQIA+, me sinto confortável e plenamente capaz de alcançar meus objetivos e sonhos de carreira na LG, sem ter nenhuma insegurança em relação à orientação sexual. E é nossa missão passar essa mesma mensagem e sentimento a todos”.
Vale destacar que o assunto referente à Letícia foi visto como uma oportunidade de crescimento da companhia. “Mesmo que organicamente nosso movimento tenha sido empático, partindo para o acolhimento com a nossa verdade e abraçando a causa da Letícia, percebemos também que podemos crescer nessa agenda. A Letícia nos contou que tinha a vontade de dividir seu caso na LG com as pessoas fora dela, e quando a apoiamos nessa frente, buscamos novas formas de nos estruturar para sermos cada vez mais proativamente inclusivos. Sempre podemos e devemos evoluir, aprender, tornar essas tratativas mais complexas e mais objetivas, mais planejadas”, afirma.
“Devemos ampliar o espaço para falar sobre o assunto, sempre partindo da nossa visão empática. Se acontecer algo novo na sua empresa e você ainda não tiver nada estruturado para isso, parta da empatia e da humanidade, se permitindo aprender”, aconselha.
Papel do RH
A área de Gente tem um papel importante nesse contexto, “Enquanto RH, nosso papel é nos colocar no lugar do outro e permitir que ele externe a direção que o fará mais feliz. É claro que a gente deve conduzir, trocar uma ideia e entrar em um consenso, mas sempre através da visão do outro”, reflete Danilo. “Isso porque temos uma cultura de acolhimento e a questão que envolve o tema é buscar a melhor maneira de promover a felicidade em nosso ambiente.”
O Gerente acredita que somente com verdadeiros princípios de diversidade e inclusão na cultura da empresa é que se é possível promover o acolhimento e abrir espaço para mais ações. “O RH deve trazer os temas de inclusão para os dirigentes da empresa e, a partir daí, desdobrar desde ações mais orgânicas como matérias sobre o assunto e rodas de conversas com colaboradores, até definições institucionais como a inclusão da pauta no código de ética e conduta e nos valores da organização”, comenta.
Em termos burocráticos, a gestão de pessoas também deverá tomar algumas medidas em casos como o de Letícia. “A primeira atitude é conectar nome social aos logins, e-mails e todos os acessos internos. Sobre a documentação, a Letícia precisa, primeiramente, realizar seu processo de mudança de nome no cartório e depois nos encaminhar os novos documentos para a atualização”.
Preconceito e resistência
É possível que nos deparemos com falas e comportamentos de preconceito. É claro que se, desde o começo, a empresa mostra seu apoio, a tendência é que situações assim sejam reduzidas. Entretanto, caso mesmo assim precisemos lidar com algum momento de falta de respeito, Danilo defende que o diálogo sempre deve vir em primeiro lugar. “É importante avaliar o cenário, sempre na perspectiva do respeito ao próximo, reforçando os valores da companhia e seus direcionamentos de ética e conduta.”
“O primeiro caminho sempre deve ser o diálogo, mas é essencial que a empresa enfatize de maneira assertiva a seriedade do tema, avaliando recorrência e gravidade dos casos, manifestando como condição inegociável o respeito às pessoas”, recomenda.
Mindset diverso é vantagem competitiva
Para o gestor, a diversidade promove a pluralidade e permite que cada indivíduo enxergue valor no que é diferente, o que acaba se tornando uma vantagem competitiva para a empresa. “É importante que haja um mindset de não só respeitar a diversidade, mas valorizá-la. As organizações que têm suas pessoas orientadas a apreciar o que é diverso crescem muito mais porque desenvolvem skills multidisciplinares, maior poder de comunicação entre pessoas e times e promovem a atitude de colaboração. Valorizar as diferenças possibilita um ambiente muito mais rico e produtivo”, avalia.
Por sua vez, os prejuízos para as companhias que ainda não investem nessa questão são muitos. “A empresa que se fecha para o assunto está passando um recado, selecionando pessoas e desenvolvendo colaboradores numa cultura mais engessada, menos colaborativa, menos plural, o que não é saudável, nem sustentável”, finaliza.
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